Velhos Pacientes

"O homem que é firme, paciente, simples, natural e tranquilo está perto da virtude".

Confúcio

Andy Warhol, artista plástico americano, que viveu intensamente as décadas de 1960 e 1970, no seu atelier The Factory, em Nova York, vaticinou: no futuro todos terão seus quinze minutos de fama. Como todo mundo está falando - e fotografando e filmando - de si nas redes sociais, resolvi falar um pouco de mim. Sou médico, especialista em Geriatria. O que quer dizer geriatria, mesmo? Bem, eu cuido de velhos. Ou aquele que está ou acredita que está ficando velho. Cuido muito de pessoas bem velhas, às vezes muito doentes, tomando vários remédios - o que chamamos de Polifarmácia. Geriatria - embora as pessoas falem muito que o geriatra deveria ser procurado bem cedo, para se ter uma velhice melhor, em todos os sentidos: independência, autonomia, saúde física e mental, participação na vida da família e da comunidade, é a especialidade médica voltada para o cuidados das pessoas mais velhas. E lamento informar que uma velhice ativa e saudável depende mais da atitude da pessoa ao longo da vida do que de cuidados médicos . Vale lembrar que uma sábia atitude é vacinar-se: isso pode fazer diferença. Alguns dos lugares mundo com maior número de longevos (algumas delas foram descritas na Zonas Azuis) revelam que a longevidade pouco tem a ver com intervenções médicas, talvez mesmo o contrário - menos intervenções (desnecessárias), maior longevidade. Se a sala de espera de um geriatra estiver cheia de pessoas jovens e saudáveis, algo está errado. É melhor ficar atento.

Um olhar clínico para a velhice

A expertise do geriatra é o cuidado holístico de velhos (às vezes em extremos etários), com várias doenças - Polipatologia - , usando vários medicamentos, frágeis, por vezes uma espécie de last resort, quando os especialistas não dão mais conta do manejo da complexidade que o cuidado médico toma na velhice. O ideal é que atue em atendimento ambulatorial, hospitalar, em ILPIs e no domicílio. Bem como se ampare nas perspectivas de cuidado multiprofissional e interdisciplinar - anote, isto é importante: uma andorinha só não faz verão. Agora, se algum jovem quiser buscar uma orientação, está tudo certo. O geriatra tem um olhar especial para as pessoas mais jovens, podendo perscrutar o processo de envelhecimento e sugerir alguns caminhos para uma velhice mais satisfatória. A ilusão de controle é frequente na prática médica. Se controlar nossas vidas é dificil, controlar a vida do outro é praticamente impossível. Então é isso: sou geriatra e cuido de velhos.

Somos todos pacientes

Se a palavra velho te incomoda, basta substituir por idoso. Mas, veja bem: eu carrego o sobrenome Velho, desde que nasci. Não poderia ter dificuldades com isso. Recentemente li um artigo médico que sugeria que as palavras velho, idoso, e outras poderiam ser expressão de Etarismo. E propunha expressões como "uma pessoa de 75 anos" ou algo do gênero ao se falar de uma pessoa idosa (ou velha). Em que pese que a discriminação por qualquer motivo e os preconceitos devam ser combatidos e enfrentados diuturnamente  (e aqui falo de políticas públicas e culturais) - sendo que os profissionais de saúde tem um papel extremamente relevante nisso - algumas questões tem um certo preciosismo. A grande maioria das pessoas idosas não se incomoda em ser chamados de velho - pois assim se sentem - e muitas vezes a expressão é até alegre e reconfortante ("estou velho mesmo"). Lembra um pouco a eterna polêmica "clientes e pacientes". Eu ainda utilizo cotidianamente a palavra paciente. Até porque vejo razões para isso, que transcendem a ideia de passividade: o paciente precisa ter paciência com os médicos, com a família, com os profissionais de saúde, com a doença, com os exames, os tratamentos e até consigo mesmos. Em se tratando de saúde, na verdade, todos temos que ser pacientes.